26 de setembro de 2010

Mais um pouco sobre a facudade

Quando escrevi o último post sobre a faculdade tinha tanta coisa pra contar que acabei pulando a parte do "Online summer program", da "introduction week" e os amigos que fiz por lá. Tratam-se de programas de aceleração do processo de "aculturação" (não sei se existe em português, mas acho que dá pra entender). Primeiro, ainda no Brasil, tivemos esse programa online, que é baseado em uma espécie de facebook interno onde conhecemos alguns de nossos colegas, com perfis que incluem fotos, portfolios, informações sobre qual faculdade vão estar, qual especialização, onde vão morar, etc. Depois somos separados em grupos, sempre de países o mais distantes possível, fisica e culturalmente, com um "e-coach" holandês (que fez o bacharelado lá e está prestes a começar o mestrado como nós), e recebemos alguns assignments cuja solução depende tanto de um trabalho em grupo com cada participate vindo de um lugar totalmente diferente (portanto temos que nos esforçar pra suprir as diferenças culturais e de fuso-horário) quanto da utilização das "facilities" de lá, assim pegamos intimidade com a estrutura da universidade.

 

Quando chegamos aqui tivemos mais uma semana parecida com isso, mas agora com palestras (e festas!), usando coisas mais específicas, como as impressoras a que temos acesso, os departamentos onde devemos procurar cada tipo de informação, etc. Eles chamam de "Introduction week", e no final dela temos que apresentar um "projeto", que na verdade é só uma besteira qualquer que nos ajude a nos acostumar mais rapidamente com a Holanda, com Delft, com a cultura e com a língua. Meu grupo criou um jogo, teoricamente de tabuleiro, mas acabei montando toda a estrutura no power point e levando meu datashow pra jogarmos ao vivo no telão. O jogo ficou bem bonitinho, eu fiz o tabuleiro-mapa de Delft, um espanhol, que estuda informática, fez o dado girar, o resto foi tirar fotos do que precisávamos e coletar os as informações pra fazer o jogo, pegamos coisas típicas da holanda como peões (um moinho, um queijo, um sapato de madeira, uma bicicleta, um van Gogh, um Cruyf, etc) e os jogadores tinham que fazer coisas típicas daqui, aprendendo onde deveriam ir para conseguir o que as "objective cards" mandavam. Cada um escreveu situações que teve que enfrentar aqui e eu tratei de dar um tom irreverente e transformamos nesses cartões que estão aí embaixo. O tabuleiro também está, mas quem quiser muito me pede que eu mando o ppt por email. Desculpem a formatação, tá terrível de alinhar essas imagens aí! Mas as frases dão várias dicas engraçadinhas de como se comportar aqui e sempre a tradução da frase principal em holandês... Vale à pena dar uma lidazinha! =)





 



 






 










Mas o engraçado é que o jogo tinha que ser todo forjado, com os números que íamos tirar nos dados já pré-estabelecidos pra conseguirmos os nossos "objetivos" mais rápido e podermos apresentar todas as cartas no tempo que tínhamos. Nossa apresentação foi muito bem recebida, o "juri" (professores daqui escolhidos aleatoriamente) elogiou muito e fez bastante sucesso entre os colegas que assistiram.


Depois vieram minhas aulas no "The Why Factory" (T?F), com o MVRDV, o Winny Maas e etc, como eu já contei no outro post, que estão sendo incríveis, estou apaixonado e tal. Nessas aulas conheci meus amigos mais próximos, que estão estudando como mesmo e já saímos algumas vezes aqui por Rotterdam, como vou contar em outro post específico.


Além disso, na T?F também tivemos que escolher um workshop pra fazer em duas semanas em que as aulas param em novembro pra isso. Então, dependendo de em qual eu for alocado (mandamos apenas nossa primeira , segunda e terceira opção), vou fazer uma viagem com eles pra Jacarta ou pra Pequim! O problema é que tem uma possibilidade de as passagens e hotel não serem completamente custeados pela universidade, então pode ser que eu acabe pedindo pra ficar no workshop que é sobre o Alaska (extreme conditions) pro qual ninguém viaja, fica só por aqui mesmo. Mas tudo bem, vai ser interessante as well, porque o tema é bem legal.

Além dessas aulas, como eu já disse, tenho fora da T?F uma matéria de "Building technology", e agora já comecei a escrever meu trabalho para essa disciplina. Vamos levando toda semana para discutir com o nosso "tutor" e vamos melhorando o que no final vai ser uma essay de 2500 palavras mais ou menos, com muitos desenhos técnicos, esquemas, croquis, alguns desenhos artísticos, etc. Se alguém quiser pode me pedir tb no final do semestre que mando por email. É sobre dois prédios que eles dão e que temos que analisar, comparar entre si e com um terceiro à nossa escolha (eu escolhi o Palácio Gustavo Capanema, o "MEC", do Lucio Costa, Carlos Leão, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Ernani Vasconcellos e Jorge Machado Moreira, com croquis de concepção do Le Corbusier, que eu conheco bem pois costumava dar uma aula sobre o edifício).


O tema que eu escolhi foi a capacidade de "isolamento" das peles dos edifícios. Os dois daqui são prédios antigos que tiveram uma reforma que em ambos adicionou uma espécie de átrio, em ambos os casos uma grande "greenhouse" (eles chamam assim, "estufa", que em português vira uma conotação negativa por causa do calor, mas aqui é normal) com peles de vidro enormes. A diferença é que um deles (o Westraven, em Utrech) tem um bom sistema de isolamento (aliás, parte dele parece muito com o que eu "criei" pra Cidade do Sexo sem saber que existia!!!) e o outro é bem precário em relação a isso na "green house" (o outro, por acaso é a BK-City, o prédio onde eu estudo, em Delft. BK é abreviação de Bouwkunde, que não é arquitetura nem engenharia, é "a ciência de construir"). Como no final temos que propôr um "re-design" pra uma parte de deles, então pensei em uma solução que pudesse ser uma segunda pele com esses "colchões de ar" parecidos com os da cidade do sexo pra protegê-lo do frio no inverno, quando o heating não dá conta do recado e, com células sensíveis ao calor e/ou aos raios do sol, se abrisse e virasse um grande brise-soleil como o do MEC, no verão, quando também fica muito quente dentro. Essa solução de interação com a natureza acaba tendo uma referência muito próxima com o Institute du Monde Arabe, em Paris, como minha mãe comentou, mas na verdade teve mais inspiração no próprio edifício de Ultretch, que tem uma enorme fachada principal com pequenos quadradinhos de plástico que interagem com o vento formando uma enorme tela que parece uma porção de pixels, uma coisa meio high tech... Mas é só vento e arquitetura! Enfim!

Fora isso, temos as palestras de "design process", e semana passada ou restrasada assisti à palestra mais incrível da minha vida! Foi com outro dos meus maiores ídolos, o Kas Oosterhuis (http://www.oosterhuis.nl) e eu simplesmente passei a entender muito mais tudo aquilo que eu sempre pesquisei sobre arquitetura líquida! O cara é foda! Tô de boca aberta até agora! Como as coisas mais complexas parecem simples quando ele fala! E aliás, isso é exatamente o que ele diz, que "complexo" é algo totalmente diferente de "complicado", que ele exemplifica como as coisas do Frank Gehry, que têm aquela aparência complicada, mas não têm nada de complexo... São apenas arquitetura tradicional desconstruída... Como quando ele pega uma porta e corta na diagonal e tem uma porta desconstrutivista... Boba. Aliás, a única coisa meio chata da palestra é que ele falava mal de todos os outros arquitetos fodassos, como o próprio Frank Gehry e o Winny Maas, meu ídolo do MVRDV e cabeça do meu departamento aqui na faculdade... Mas quando o Kas Oosterhuis fala parece mesmo que todos os outros são uns bobos! Ou os arquitetos em geral... A arquitetura como a gente conhece é muito ingênua, só pegando uma série de coisas prontas (portas, janelas, tijolos, telhas, etc) e botando tudo junto... O que ele faz é completamente diferente! Parece tudo uma evolução da cidade do sexo e de toda a teoria que eu tinha por trás daquilo. A palestra dele começa com uma foto de um bando de pássaros voando juntos formando um desenho completamente aleatório e depois vai pra uma foto de uns cabos de energia com todos os pássaros pousados nele, em fila... O que ele diz é que os pássaros obedecem a uma lógica muito simples e quando se insere algum elemento que possa modificar essa lógica (o lugar pra eles pousarem, nesse caso) vc consegue modificar instantaneamente o comportamento deles. E é assim que ele trata a arquitetura, pois nós tb obedecemos a lógicas muito simples e os espaços que ele cria, a partir dos fluxos-padrão de pessoas, modificam a nossa maneira de nos comportar... Então ele cria edifícios totalmente diferentes, baseados nesses fluxos e portanto com uma forma sempre meio amebóide, sem qualquer coluna por exemplo, jogando toda a carga pra uma "pele" externa, que não pode ser considerada exatamente uma fachada, porque ao mesmo tempo que o é, é tb teto, janela, porta, piso, estrutura, tudo! Vale à pena dar até uma pesquisada na internet pra achar mais imagens, mas aqui embaixo tem algumas.

Ele é o cabeça de outro departamento, o "Hyperbody" que era a minha segunda opção e que certamente vou me inscrever semestre que vem. Trata de edifícios que interagem com o usuário e o escritório dele já criou algumas coisas assim... Uma ponte que quando o trem passa se fecha toda e vira um túnel e depois se abre de novo num movimento lindo... Isso ainda não foi construído, mas um protótipo de pele reativa já foi, de uns 7 metros de altura, que quando as pessoas passavam em frente se contorcia toda... Vimos um vídeo dela funcionando e é na verdade indescritível. Parece muito mais uma matéria orgânica do que mecânica. Aqui estão algumas das fotos dos trabalhos dele. E reparem a relação com o ambiente construído em volta... À primeira vista parece totalmente fora do contexto, mas essas linhas orgânicas que ele cria sempre vêm de algo pré-existente, como a linha do telhado das casas super antigas no meio do pavilhão que tem aí embaixo, na 4a foto... As pessoas costumam achar que pra contextualizar algo temos que simplesmente copiar o existente e na verdade eu acho isso uma maneira simplória e cafona de contextualizar... Ao contrário desse trabalho dele, dêm uma olhada:









Aaaaahhh! Queria passar o resto da vida aqui vendo tanta coisa maravilhosa! Como meu pai comentou outro dia, não consigo medir a quantidade de coisas novas que vou levar na bagagem pra mostrar pros meus alunos aí no Brasil... E na verdade começo até a achar que eu era um professor medíocre antes de ver todas essas coisas! E o pior é que elas estão apenas começando!!! Aaaaaaaaahhhhhhh!!!

Bom, acho melhor parar por aqui, senão vou ter um ataque histérico... Vou escrever um pouquinho agora sobre a minha vida cultural-noturna em Rotterdam, que não é muito intensa, pois não sou tanto de sair assim, mas tem sido feita de pequenos momentos deliciosos com bons novos amigos, dos quais também vou falar no próximo post.

Beijos e até logo!
=)

Um comentário:

  1. Fala Igor,
    É, realmente não dá para medir a bagagem que você terá... Mas dá pra continuar escrevendo ne, huahuahuauah. Cara estou empolgado contigo, em breve estarei em Moscou(virtualmente, heheh) no treinamento ministrado pelo meu ídolo na ilustração, o Stanislav Orekhov. O ritmo de ensino no exterior é muito intenso, faz parecer que estávamos no ginásio, mesmo nos nossos tempos de faculdade. Bom, aguardo seus posts, abraços, fui!!!

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